3.6.08

Conselhos para melhorar o nosso galego oral



From: vitinhoourense, 1 week ago





O professor Eduardo Maragoto ensina-nos 22 normas fáceis de aprender para melhorar substancialmente o galego falado. O desenho da apresentaçom é de Noélia do Rego.


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22.5.08

A vinheta de Kalvellido

Bio-combustíveis para um futuro radiante.



Kalvellido na web

8.5.08

Patacas novas



Depois do São José, patacas velhas não chas quero. Quero das de três euros.

2.5.08

A fome

Fome: alimentos como negócio
Leonardo Boff

O mundo está se alarmando com a alta do preço dos alimentos e com as previsões do aumento da fome no mundo. A fome representa um problema ético, denunciado por Gandhi: “a fome é um insulto, ela avilta, desumaniza e destrói o corpo e o espírito; é a forma mais assassina que existe”. Mas ela é também resultado de uma politica econômica. O alimento se transformou em ocasião de lucro e o processo agroalimentar num negócio rentoso. Mudou-se a visão básica que predominava até o advento da industrialização moderna, visão de que a Terra era vista como a Grande Mãe. Entre a Terra e o ser humano vigoravam relações de respeito e de mútua colaboração. O processo de produção industrialista considera a Terra apenas como baú de recursos a serem explorados até à exaustão.

Continua (...)

24.4.08

25 de Abril sempre



As Portas que Abril abriu…

Era uma vez um país
onde entre o mar e a guerra
vivia o mais infeliz
dos povos à beira-terra.
Onde entre vinhas sobredos
vales socalcos searas
serras atalhos veredas
lezírias e praias claras
um povo se debruçava
como um vime de tristeza
sobre um rio onde mirava
a sua própria pobreza.

Era uma vez um país
onde o pão era contado
onde quem tinha a raiz
tinha o fruto arrecadado
onde quem tinha o dinheiro
tinha o operário algemado
onde suava o ceifeiro
que dormia com o gado
onde tossia o mineiro
em Aljustrel ajustado
onde morria primeiro
quem nascia desgraçado.

Era uma vez um país
de tal maneira explorado
pelos consórcios fabris
pelo mando acumulado
pelas ideias nazis
pelo dinheiro estragado
pelo dobrar da cerviz
pelo trabalho amarrado
que até hoje já se diz
que nos tempos do passado
se chamava esse país
Portugal suicidado.

Ali nas vinhas sobredos
vales socalcos searas
serras atalhos veredas
lezírias e praias claras
vivia um povo tão pobre
que partia para a guerra
para encher quem estava podre
de comer a sua terra.

Um povo que era levado
para Angola nos porões
um povo que era tratado
como a arma dos patrões
um povo que era obrigado
a matar por suas mãos
sem saber que um bom soldado
nunca fere os seus irmãos.

Ora passou-se porém
que dentro de um povo escravo
alguém que lhe queria bem
um dia plantou um cravo.

Era a semente da esperança
feita de força e vontade
era ainda uma criança
mas já era a liberdade.

Era já uma promessa
era a força da razão
do coração à cabeça
da cabeça ao coração.
Quem o fez era soldado
homem novo capitão
mas também tinha a seu lado
muitos homens na prisão.

Esses que tinham lutado
a defender um irmão
esses que tinham passado
o horror da solidão
esses que tinham jurado
sobre uma côdea de pão
ver o povo libertado
do terror da opressão.

Não tinham armas é certo
mas tinham toda a razão
quando um homem morre perto
tem de haver distanciação

uma pistola guardada
nas dobras da sua opção
uma bala disparada
contra a sua própria mão
e uma força perseguida
que na escolha do mais forte
faz com que a força da vida
seja maior do que a morte.

Quem o fez era soldado
homem novo capitão
mas também tinha a seu lado
muitos homens na prisão.

Posta a semente do cravo
começou a floração
do capitão ao soldado
do soldado ao capitão.

Foi então que o povo armado
percebeu qual a razão
porque o povo despojado
lhe punha as armas na mão.

Pois também ele humilhado
em sua própria grandeza
era soldado forçado
contra a pátria portuguesa.

Era preso e exilado
e no seu próprio país
muitas vezes estrangulado
pelos generais senis.

Quem o fez era soldado
homem novo capitão
mas também tinha a seu lado
muitos homens na prisão.

Posta a semente do cravo
começou a floração
do capitão ao soldado
do soldado ao capitão.

Foi então que o povo armado
percebeu qual a razão
porque o povo despojado
lhe punha as armas na mão.

Pois também ele humilhado
em sua própria grandeza
era soldado forçado
contra a pátria portuguesa.

Era preso e exilado
e no seu próprio país
muitas vezes estrangulado
pelos generais senis.

E então por vinhas sobredos
vales socalcos searas
serras atalhos veredas
lezírias e praias claras
desceram homens sem medo
marujos soldados «páras»
que não queriam o degredo
dum povo que se separa.

E chegaram à cidade
onde os monstros se acoitavam
era a hora da verdade
para as hienas que mandavam
a hora da claridade
para os sóis que despontavam
e a hora da vontade
para os homens que lutavam.
Em idas vindas esperas
encontros esquinas e praças
não se pouparam as feras
arrancaram-se as mordaças
e o povo saiu à rua
com sete pedras na mão
e uma pedra de lua
no lugar do coração.

Dizia soldado amigo
meu camarada e irmão
este povo está contigo
nascemos do mesmo chão
trazemos a mesma chama
temos a mesma ração
dormimos na mesma cama
comendo do mesmo pão.
Camarada e meu amigo
soldadinho ou capitão
este povo está contigo
a malta dá-te razão.

Foi esta força sem tiros
de antes quebrar que torcer
esta ausência de suspiros
esta fúria de viver
este mar de vozes livres
sempre a crescer a crescer
que das espingardas fez livros
para aprendermos a ler
que dos canhões fez enxadas
para lavrarmos a terra
e das balas disparadas
apenas o fim da guerra.

Foi esta força viril
de antes quebrar que torcer
que em vinte e cinco de Abril
fez Portugal renascer.

E em Lisboa capital
dos novos mestres de Aviz
o povo de Portugal
deu o poder a quem quis.

Mesmo que tenha passado
às vezes por mãos estranhas
o poder que ali foi dado
saiu das nossas entranhas.
Saiu das vinhas sobredos
vales socalcos searas
serras atalhos veredas
lezírias e praias claras
onde um povo se curvava
como um vime de tristeza
sobre um rio onde mirava
a sua própria pobreza.

E se esse poder um dia
o quiser roubar alguém
não fica na burguesia
volta à barriga da mãe.
Volta à barriga da terra
que em boa hora o pariu
agora ninguém mais cerra
as portas que Abril abriu.

Essas portas que em Caxias
se escancararam de vez
essas janelas vazias
que se encheram outra vez
e essas celas tão frias
tão cheias de sordidez
que espreitavam como espias
todo o povo português.
Agora que já floriu
a esperança na nossa terra
as portas que Abril abriu
nunca mais ninguém as cerra.

Contra tudo o que era velho
levantado como um punho
em Maio surgiu vermelho
o cravo do mês de Junho.

Quando o povo desfilou
nas ruas em procissão
de novo se processou
a própria revolução.

Mas eram olhos as balas
abraços punhais e lanças
enamoradas as alas
dos soldados e crianças.

E o grito que foi ouvido
tantas vezes repetido
dizia que o povo unido
jamais seria vencido.

Contra tudo o que era velho
levantado como um punho
em Maio surgiu vermelho
o cravo do mês de Junho.

E então operários mineiros
pescadores e ganhões
marçanos e carpinteiros
empregados dos balcões
mulheres a dias pedreiros
reformados sem pensões
dactilógrafos carteiros
e outras muitas profissões
souberam que o seu dinheiro
era presa dos patrões.

A seu lado também estavam
jornalistas que escreviam
actores que se desdobravam
cientistas que aprendiam
poetas que estrebuchavam
cantores que não se vendiam
mas enquanto estes lutavam
é certo que não sentiam
a fome com que apertavam
os cintos dos que os ouviam.

Porém cantar é ternura
escrever constrói liberdade
e não há coisa mais pura
do que dizer a verdade.

E uns e outros irmanados
na mesma luta de ideais
ambos sectores explorados
ficaram partes iguais.

Entanto não descansavam
entre pragas e perjúrios
agulhas que se espetavam
silêncios boatos murmúrios
risinhos que se calavam
palácios contra tugúrios
fortunas que levantavam
promessas de maus augúrios
os que em vida se enterravam
por serem falsos e espúrios
maiorais da minoria
que diziam silenciosa
e que em silêncio fazia
a coisa mais horrorosa:
minar como um sinapismo
e com ordenados régios
o alvor do socialismo
e o fim dos privilégios.

Foi então se bem vos lembro
que sucedeu a vindima
quando pisámos Setembro
a verdade veio acima.

E foi um mosto tão forte
que sabia tanto a Abril
que nem o medo da morte
nos fez voltar ao redil.

Ali ficámos de pé
juntos soldados e povo
para mostrarmos como é
que se faz um país novo.

Ali dissemos não passa!
E a reacção não passou.
Quem já viveu a desgraça
odeia a quem desgraçou.

Foi a força do Outono
mais forte que a Primavera
que trouxe os homens sem dono
de que o povo estava à espera.

Foi a força dos mineiros
pescadores e ganhões
operários e carpinteiros
empregados dos balcões
mulheres a dias pedreiros
reformados sem pensões
dactilógrafos carteiros
e outras muitas profissões
que deu o poder cimeiro
a quem não queria patrões.

Desde esse dia em que todos
nós repartimos o pão
é que acabaram os bodos
— cumpriu-se a revolução.

Porém em quintas vivendas
palácios e palacetes
os generais com prebendas
caciques e cacetetes
os que montavam cavalos
para caçarem veados
os que davam dois estalos
na cara dos empregados
os que tinham bons amigos
no consórcio dos sabões
e coçavam os umbigos
como quem coça os galões
os generais subalternos
que aceitavam os patrões
os generais inimigos
os generais garanhões
teciam teias de aranha
e eram mais camaleões
que a lombriga que se amanha
com os próprios cagalhões.
Com generais desta apanha
já não há revoluções.

Por isso o onze de Março
foi um baile de Tartufos
uma alternância de terços
entre ricaços e bufos.

E tivemos de pagar
com o sangue de um soldado
o preço de já não estar
Portugal suicidado.

Fugiram como cobardes
e para terras de Espanha
os que faziam alardes
dos combates em campanha.

E aqui ficaram de pé
capitães de pedra e cal
os homens que na Guiné
aprenderam Portugal.

Os tais homens que sentiram
que um animal racional
opõe àqueles que o firam
consciência nacional.

Os tais homens que souberam
fazer a revolução
porque na guerra entenderam
o que era a libertação.

Os que viram claramente
e com os cinco sentidos
morrer tanta tanta gente
que todos ficaram vivos.

Os tais homens feitos de aço
temperado com a tristeza
que envolveram num abraço
toda a história portuguesa.

Essa história tão bonita
e depois tão maltratada
por quem herdou a desdita
da história colonizada.

Dai ao povo o que é do povo
pois o mar não tem patrões.
– Não havia estado novo
nos poemas de Camões!

Havia sim a lonjura
e uma vela desfraldada
para levar a ternura
à distância imaginada.

Foi este lado da história
que os capitães descobriram
que ficará na memória
das naus que de Abril partiram

das naves que transportaram
o nosso abraço profundo
aos povos que agora deram
novos países ao mundo.

Por saberem como é
ficaram de pedra e cal
capitães que na Guiné
descobriram Portugal.

E em sua pátria fizeram
o que deviam fazer:
ao seu povo devolveram
o que o povo tinha a haver:
Bancos seguros petróleos
que ficarão a render
ao invés dos monopólios
para o trabalho crescer.
Guindastes portos navios
e outras coisas para erguer
antenas centrais e fios
dum país que vai nascer.

Mesmo que seja com frio
é preciso é aquecer
pensar que somos um rio
que vai dar onde quiser

pensar que somos um mar
que nunca mais tem fronteiras
e havemos de navegar
de muitíssimas maneiras.

No Minho com pés de linho
no Alentejo com pão
no Ribatejo com vinho
na Beira com requeijão
e trocando agora as voltas
ao vira da produção
no Alentejo bolotas
no Algarve maçapão
vindimas no Alto Douro
tomates em Azeitão
azeite da cor do ouro
que é verde ao pé do Fundão
e fica amarelo puro
nos campos do Baleizão.
Quando a terra for do povo
o povo deita-lhe a mão!

É isto a reforma agrária
em sua própria expressão:
a maneira mais primária
de que nós temos um quinhão
da semente proletária
da nossa revolução.

Quem a fez era soldado
homem novo capitão
mas também tinha a seu lado
muitos homens na prisão.

De tudo o que Abril abriu
ainda pouco se disse
um menino que sorriu
uma porta que se abrisse
um fruto que se expandiu
um pão que se repartisse
um capitão que seguiu
o que a história lhe predisse
e entre vinhas sobredos
vales socalcos searas
serras atalhos veredas
lezírias e praias claras
um povo que levantava
sobre um rio de pobreza
a bandeira em que ondulava
a sua própria grandeza!
De tudo o que Abril abriu
ainda pouco se disse
e só nos faltava agora
que este Abril não se cumprisse.
Só nos faltava que os cães
viessem ferrar o dente
na carne dos capitães
que se arriscaram na frente.

Na frente de todos nós
povo soberano e total
que ao mesmo tempo é a voz
e o braço de Portugal.

Ouvi banqueiros fascistas
agiotas do lazer
latifundiários machistas
balofos verbos de encher
e outras coisas em istas
que não cabe dizer aqui
que aos capitães progressistas
o povo deu o poder!
E se esse poder um dia
o quiser roubar alguém
não fica na burguesia
volta à barriga da mãe!
Volta à barriga da terra
que em boa hora o pariu
agora ninguém mais cerra
as portas que Abril abriu!

Ary dos Santos
Lisboa, Julho-Agosto de 1975

23.4.08

Os tempo dos críticos já passou

Noutros tempos os críticos eram os interpretes qualificados que nos guiavam nas nossas escolhas e preferências em matéria de cinema, literatura, música e arte. Uma película de Arthur Penn ou de Rossellini não era o mesmo que uma outra produção comercial qualquer, não para os que prestávamos atenção. Uma novela de John Dos Passos ou de Thomas Pynchon chegava a nós por recomendação dos especialistas, já fossem críticos ou professores.
Hoje os críticos famosos doutros tempos estão a desaparecer sem remédio dos grandes jornais do mundo, tornam-se irrelevantes, seu trabalho perde importância. Estou a falar, naturalmente, daqueles que levaram essa profissão a um degrau elevado de competência e de autoridade, reconhecida alem das fronteiras ideológicas. Internet tem muito a ver com isto. Os grandes monstros da comunicação não podem competir neste novo médio democrático que é a rede. Muitos bloggers têm uma grande capacidade de influir na opinião pública em âmbitos como o da música, o arte, a televisão, o teatro etc. Predomina o consenso da comunidade de internautas sobre a opinião especializada, não há mais que ver os sites das livrarias on-line, como Amazon. A opinião do críticos profissionais é muito suspeitosa. E não faltam motivos para esta desconfiança, ao contrário, acho que sobram.
Para uma geração que aprendeu a nadar no mar de internet e que respira por brânquias digitais, o tradicional crítico dum jornal não significa nada, mesmo suas opiniões podem ser-lhe tóxicas. Por outro lado, quem pode duvidar que a hipertrofia da comercialização nesta profissão é uma das causas do seu desprestígio?

20.4.08

Rádio e televisão portuguesas na Galiza

Eis o vídeo do debate no plenário do passado 08 de Abril, no Parlamento da Galiza, em que foi aprovada a Proposição não de Lei conforme a câmara insta ao Governo galego a adoptar as medidas precisas perante o Governo espanhol com o fim de a Galiza receber as emissões de rádio e televisão portuguesas.
A proposiçao foi enmendada por Francisco Cerviño e Diego Calvo. O texto final foi resultado de uma transacção.

10.3.08

Um pensamento de Horkheimer sobre a honestidade intelectual

"A revolutionary career does not lead to banquets and honorary titles, interesting research and professorial wages. It leads to misery, disgrace, ingratitude, prison and a voyage into the unknown, illuminated by only an almost superhuman belief."


Max Horkheimer

27.2.08

Elogio do voto (in)útil

No encontro Zp vs. Rakhoi, a expectação era a própria dum combate de box entre dois grandes campeões. Simplificadas como são as ideias nos debates, não é nesse encontro baixo os focos que temos de decidir quem ganhou senão mais cedo: é depois de ter claro qual é a nossa equipa que vamos ao estádio com a torcida. Ou, se não for esse o caso, decidiremos mais tarde, quando os jornalistas debatam em programas de TV, quando os politólogos nos digam em que acertou ou errou o candidato zeta ou pê, ou quando vejamos os resultados das pesquisas científicas, que serão avaliadas de jeito muito distinto nos diferentes meios de comunicação... Eu gostaria de fazer um elogio do voto (in)útil, aquele que emitimos polo partido que menos possibilidades tem, para assim demonstrarmos a nossa inconformidade com os mais favorecidos polo público, evitando a abstenção, que poderia ser interpretada de jeito equívoco ou tomada por indiferença, e sem medo de que o candidato por nós elegido entenda que estamos de acordo com ele, sabendo que, em qualquer caso, si assim o faz, não terá consequências.

A lei d’Hont é injusta, favorece aos grandes partidos maioritários. Ademais há injustiças, verdadeiros disparates, que concernem a representatividade das minorias. Estas conseguem resultados díspares e disparatados, disparatadamente díspares em proporção ao número de sufrágios que os cidadãos lhes concedem. Então, IU com milhões de votos que tem conseguido nalgum comício, não chega ao número de deputados de CIU ou do PNV.

10.2.08

As nespereiras já florescem

“Fevereiro e as mulheres, no dia têm sete pareceres”, pode-se ler no interessante Refraneiro galego de Henrique Gippini Escoda. Em Lugo, as máximas para hoje são de vinte graus e as mínimas de cero, o qual amostra o provérbio popular ser atinadíssimo. Entrementes, nas marinhas as mimosas já amarelecem com arroubo, este ano com demora por culpa do frio. Hoje tivemos um dia primaveral: dava gosto passear por Sada. Mas, ¡cuidado!, neste mês ainda não é descartável uma boa nevada nas montanhas. Por enquanto, as únicas folerpas que olhei cair foram as pétalas brancas das nespereiras quando o vento lhes abalou as galhas no sossego da soalheira. As cerejeiras já estão em flor dum jeito glorioso para esta primavera eleitoral, e enquanto as fragrâncias todas se misturam na mente, os pensamentos que um trazia consigo mesmo sobre a politica dissipam-se, e já se esqueceu um do que leu sobre os votantes gourmet, não vou dizer “exquisitos”, porque isto tem um significado bem distinto em castelhano e em português. Os cães acham delicioso o perfume de coisas podres. Pelo visto, não é coisa fácil agradar a todos.

7.1.08

Fim de festa

Minha mulher ergue-se cedo para ir ao hospital. Seu pai tem o sistema imunológico débil, consequência duma terapia agressiva, e a cada pouco, especialmente nestes meses de inverno, afecta-lhe alguma gripe ou coisa semelhante. O andaço causa estragos nos serviços de emergências. Neste fim de ano, meu sogro esteve com febre; o pobre tremia como um vímio verde, deitava o abrigo de pele por acima dos ombros e resmungava maldições pelo frio que se lhe metia entre carne e ossos e que nem com essas conseguia conjurar.

Quando me ponho em pé, afasto um pouco a cortina branca e vejo pela janela do primeiro andar à velha dobrada sobre as nabiças. Pensei que essa, e não outra, era e é a imagem eterna de Galiza: nas chairas douradas e castanhas, nas viçosas abas dos montes, nas alvas praias das marinhas, nos socalcos amuralhados, nas nemorosas beiras dos rios e nas fecundas veigas: uma velha inclinada, o espinhaço curvado, a cabeça por baixo da cintura, os olhos a fitar a terra mãe com raiva, a boca a cuspi-la, a língua a injuriá-la; sim, à terra mãe que a todos nos há de acolher de jeito definitivo.

Nem as catedrais que os grandes seniores eclesiais fundaram sobre o suor e o sangue dos labregos, nem as vilas ou casas da burguesia foreira e caciquil, nem o folclore resgatado nas ocasiões para as festas cívicas nem esse castelhano tão simpático que falamos os “senhoritos” das vilas e das cidades têm a jurisdição simbólica dum homem ou uma mulher abaixado sobre o rego.

Visto-me e desço as escadas de madeira, saúdo aos "inseparáveis" que parecem muito espilidos, fecho a porta e saio para a estrada. Deixo trás de mim a camélia, olho e atravesso o asfalto. Ela vai caminhando apressada cara ao garagem, e leva na mão um feixe verde. Pergunto-lhe a que anda e responde-me que a apanhar nabiças para que as levemos a Lugo. Acho que, com o preço que estão a atingir os alimentos, esta ajuda poderia ser importante para as famílias que a tenham.

Um pouco mais tarde, já em Sada, pensei ir nadar, mas as maniotas que sentia nos braços, o lombo, as pernas e os quadris, sem dúvida produzidas pelo exercício do dia anterior, não foram razão suficiente para impedir-me desistir: é sabido que, de ter essa dó, o melhor é continuar a fazer exercício para que o ácido cristalizado desapareça logo. A mulher que vejo desde o recheio é a mesma que vi na horta, figura única na milagrosa paisagem lacustre. Está na água de pés nus. Podo-a ver reflectida na areia molhada – nao é a ria um grande espelho do cosmos, tal que o eram as ilhas do Jónico no tempo de Aquiles?–, os sapatos acima duma pilha de conchas que guarda um cão pequeno e rebuldeiro, as calças arregaçadas, a artrite metida nos miolos, apanha que te apanha berbirichos ou ameijas que mais tarde há de cozer para um arroz.

Depois de chegar caminhando até a depuradora, volto por dentro da cidade, pelas ruas que decorrem em paralelo ao passeio que foi construído sobre o próprio mar. Aqui a vila conserva algo do seu sabor e aspecto original, o ar que devia ter tal e como se pode ver nas teias de Llorens. Sada tem pois dois almas: uma é a tradicional, outra a moderna. Sada a conservadora e Sada a arriscada. Passo pelas branhas e torno ao mar por uma pequena ruela cheia de restaurantes. Já não está a mulher que colhia moluscos, talvez só foi uma miragem; sou consciente de que já não fica muito daquela Galiza trabalhadora, de mãos ásperas e frente enrugada pelo sol. Hoje, como diz na imprensa o secretário geral de um importante sindicato, o motor da economia não é apenas a construção, mas os serviços. “Fique certo que a situação não e tão preocupante como gostam de exagerar os conservadores” ou algo assim vem de dizer o Cándido Méndez. Com efeito, os campos e os mares já não absorvem o esforço da maior parte dos filhos da terra, nem mesmo as fábricas. Hoje, a maior parte de nós, galegos que noutro tempo íamos pelo mundo para ver de ganha-lo, participamos num festim insustentável de esbanjamento consumista que só nos podemos permitir os países abastados, achegando em troco poucas coisas de valor à riqueza do grande mundo.

O cosmos inteiro não é bastante para a fome do homem branco. Estamos apanhados.